quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Sobre ser isso

Trilha para esse texto: clique aqui


É como se estivesse tentando prender o ar dentro de um pote de vidro. É a sensação que eu tenho quando me vejo presa geograficamente por um longo período. É a mais pura verdade: sem viajar eu não consigo nem escrever.

Me viro como posso, presa nessa cidade que me sufoca. Abraço árvores em pracinhas da esquina, de vez em nunca vagueio pela cidade à noite, sozinha, em lugares relativamente seguros, só pra poder respirar a cidade, ouvir um pouco do silêncio da noite, e me sentir um pouco livre. O excesso de pessoas, carros, barulho faz mal pra mim. Elevadores, espelhos, escadas rolantes, celulares com pessoas gritando com você por motivos que você não entende. Protestos, vigilância, opressão. Tudo isso me mata aos poucos. Não, não são os meus vícios que me matarão. É a tristeza de ver um mundo com pessoas tão alienadas com tanta razão e tão dispostas a te julgar e te sentenciar. Só porque você escolheu ser assim.

Ser livre pra mim é estar na estrada. É conversar com anônimos que não esperam nada de você, a não ser uma boa história, ou uma piada inusitada. É poder falar apenas com quem eu quiser. De preferência só com as pessoas a quem eu pagarei pelas minhas refeições e acomodação. É poder meditar ao som do mar sem ser interrompida pelo martelo do pobre vizinho que só tem os fins de semana para construir seu barraco humilde na rua de cima da minha casa.

Sinto falta de andar numa trilha, de ver cachoeira, de contar estrelas, de acender fogueira para assar marshmallows e salsichas, de tomar chimarrão, de passar o dia dentro da água. Fotografar tudo, fotografar a vida, fotografar os milagres de Deus. De abraçar árvore sem ninguém te olhando como se você fosse a louca do sobrado. De ficar descalça com o pé imundo e só calçar algo se forem meus trekking boots.

Trabalho para ter isso de volta. Cedo ou tarde estarei explorando mais uma cidade histórica, subindo mais uma montanha, armando mais um acampamento, carregando 28 quilos de mochila nas costas. Pelo menos por alguns dias. Sozinha ou acompanhada não importa. Quero apenas me sentir livre e parte da natureza de novo. Sem muros, sem concreto, sem conexão. Que minha única “rede” seja aquela que eu vou me esticar no final da tarde depois de um dia de aventuras. 

Porque eu preciso voltar a ser quem eu sou de verdade. 
Uma viajante.