Voltando um pouco pra dentro do armário... clique aqui
sexta-feira, 31 de outubro de 2014
quinta-feira, 30 de outubro de 2014
Sobre as Trilhas para Principiantes
Então você descobre que gosta de fazer trilhas. Isso (bem)
depois dos trinta anos de idade, quando seu condicionamento físico já não é tão
a favor de aventuras de risco e seus pulmões têm a força de um patinho amarelo de
borracha, daqueles que a gente brinca numa banheira (num ofurô, no meu caso). Meu
treinamento consiste em alguns quilômetros de corridas-trotinho na esteira da
academia, caminhadas subindo e descendo a Rua Augusta e idas até o chão nas
pistas de dança da vida – forninho eu não carrego não, meus amigos. Sou phynna.
Este é um relato de alguém que decidiu fazer depois dos trinta, algo que deveria ter feito aos vinte anos de idade. Nessa idade, a única trilha que eu fazia era nos jardins escondidos do Central Park. Quem conhece o lugar sabe que tipo de aventura encontramos nesses remotos anti-turísticos e apaixonantes cantinhos fora do óbvio.
Comecemos pelo óbvio. Como escolher a trilha? Se você é um principiante, pesquise tudo o que puder ANTES de fazer qualquer loucura. Veja se dá pra aguentar, se é íngreme, quanto tempo uma pessoa normal leva pra chegar ao destino (geralmente quem alimenta sites sobre dicas de viagem é alguém altamente treinado pra esse tipo de esporte, então se a pessoa diz que levou 2 horas pra fazer a travessia, você vai levar 5), qual o destino (porque a compensação é exatamente o motivo de se fazer uma trilha) e se não tem muita farofada ou gente com camiseta estampada de Romero Britto cruzando seu caminho.
Mochileiros e Trip Advisor continuam sendo os melhores sites pra pesquisas.
Eu não pesquisei na minha primeira trilha e um passeio ao Rio Aquidauana, Pantanal sul-mato-grossense, acabou virando uma trilha de 3 km dentro da mata fechada, atravessando vazantes e enfrentando uma tempestade tropical. Traumático? Nem um pouco. Os tucanos, as araras, a água gelada do rio, as chalanas, a boiada branca correndo nos vastos campos das imensas fazendas que atravessamos e até o pavor das piranhas fazem parte de uma das memórias mais lindas que tenho.
Depois disso, voltei às trilhas com muita precaução, pesquisa e preparação. Aprendi a montar uma mochila útil para a atividade, (na primeira trilha levei até nécessaire com make), me condicionei, perdi peso e comi muita cenoura e beterraba - nada melhor pra voltar com aquele bronzeado-molho-shoyu pra São Paulo sem ter que gastar um absurdo com bronzeador importado.
Sem mais delongas, e tentando ser o mais objetiva possível (sou geminiana, sorry), vamos ao que interessa. Já sabe aonde vai? Lembre-se de que, se for pra cachoeira, não vá no período de chuvas, ou você não vai entrar em nenhuma. Se for pra praia, evite alto verão. Além de cheio, é caro. Trilha boa de praia é no inverno. No verão brasileiro, vá às trilhas no inverno canadense. No inverno brasileiro, corra pras trilhas de Punta del Este. No outono? Trilhas urbanas em jardins – sim, fiz uma em Curitiba de 1 km e meio.
Vamos lá. Comece com trilhas de um dia, porque acampar já é
nível intermediário/avançado. Vista-se com shorts, camiseta e se não tiver
‘walking boots’, tênis de corrida servem. Leve uma mochila com proteção
térmica. Tanto pra uma trilha com sol, chuva ou neve, a proteção térmica é
importante. Leve duas garrafas de água de 500 ml cheias. Se for pra cachoeira,
leve duas a mais vazias, a volta é sempre subida e a sede é mortal. Se for pra
praia, não haverá água potável lá (se tiver água pra vender lá, oops, você não
está numa praia deserta, escolha mega-fail). O ideal é não ir sozinho pra trilhas
de praia, pra poder levar o maior número de garrafas d’água possível. Frutas
secas, castanhas e maçãs frescas. Barra de proteína, mini kit
primeiros-socorros, uma canga/toalha e chinelos. Repelente, carregador portátil
de celular, bússola, protetor solar, um canivete e farolete. Pelo
amor de Deus, se não conhece o lugar e não sabe se virar no meio do mato,
contrate um guia local. A não ser que você queira se perder e passar uma noite
sendo devorada por mosquitos, morrendo de fome ou tentando não ser comida por
uma onça. Não, não é porque você assistiu Lost que você vai saber como
encontrar o caminho de volta. Você não vai. Isso é sério. Enrole seu celular em
plástico filme. Vai por mim.
Agora vai, divirta-se e perca suas celulites. Trilha não combina com bebida alcoólica e cigarro, música alta e conversinha. Chegando lá, faça o que quiser. Mas lembre-se que tem que voltar, então não abusa.
Este é um relato de alguém que decidiu fazer depois dos trinta, algo que deveria ter feito aos vinte anos de idade. Nessa idade, a única trilha que eu fazia era nos jardins escondidos do Central Park. Quem conhece o lugar sabe que tipo de aventura encontramos nesses remotos anti-turísticos e apaixonantes cantinhos fora do óbvio.
Comecemos pelo óbvio. Como escolher a trilha? Se você é um principiante, pesquise tudo o que puder ANTES de fazer qualquer loucura. Veja se dá pra aguentar, se é íngreme, quanto tempo uma pessoa normal leva pra chegar ao destino (geralmente quem alimenta sites sobre dicas de viagem é alguém altamente treinado pra esse tipo de esporte, então se a pessoa diz que levou 2 horas pra fazer a travessia, você vai levar 5), qual o destino (porque a compensação é exatamente o motivo de se fazer uma trilha) e se não tem muita farofada ou gente com camiseta estampada de Romero Britto cruzando seu caminho.
Mochileiros e Trip Advisor continuam sendo os melhores sites pra pesquisas.
Eu não pesquisei na minha primeira trilha e um passeio ao Rio Aquidauana, Pantanal sul-mato-grossense, acabou virando uma trilha de 3 km dentro da mata fechada, atravessando vazantes e enfrentando uma tempestade tropical. Traumático? Nem um pouco. Os tucanos, as araras, a água gelada do rio, as chalanas, a boiada branca correndo nos vastos campos das imensas fazendas que atravessamos e até o pavor das piranhas fazem parte de uma das memórias mais lindas que tenho.
Depois disso, voltei às trilhas com muita precaução, pesquisa e preparação. Aprendi a montar uma mochila útil para a atividade, (na primeira trilha levei até nécessaire com make), me condicionei, perdi peso e comi muita cenoura e beterraba - nada melhor pra voltar com aquele bronzeado-molho-shoyu pra São Paulo sem ter que gastar um absurdo com bronzeador importado.
Sem mais delongas, e tentando ser o mais objetiva possível (sou geminiana, sorry), vamos ao que interessa. Já sabe aonde vai? Lembre-se de que, se for pra cachoeira, não vá no período de chuvas, ou você não vai entrar em nenhuma. Se for pra praia, evite alto verão. Além de cheio, é caro. Trilha boa de praia é no inverno. No verão brasileiro, vá às trilhas no inverno canadense. No inverno brasileiro, corra pras trilhas de Punta del Este. No outono? Trilhas urbanas em jardins – sim, fiz uma em Curitiba de 1 km e meio.
Agora vai, divirta-se e perca suas celulites. Trilha não combina com bebida alcoólica e cigarro, música alta e conversinha. Chegando lá, faça o que quiser. Mas lembre-se que tem que voltar, então não abusa.
segunda-feira, 27 de outubro de 2014
Sobre as Estradas
O que é um viajante senão sua estrada? Segue abaixo uma lista dos 12 filmes que mais me encantam. Para serem vistos e revistos. Quantas vezes forem necessárias. Espero que gostem.
Uma História Real
"A straight story", David Lynch - 1999
Dez
"Dah", Abbas Kiarostami - 2002
Pequena Miss Sunshine
"Little Miss Sunshine", Jonathan Dayton & Valerie Faris - 2006
Viagem a Darjeeling
"The Darjeeling Limited", Wes Anderson - 2007
Na Estrada
"On the Road", Walter Salles - 2012
Diários de Motocicleta
"Diarios de Motocicleta/The Motorcycle Diaries", Walter Salles - 2004
Assassinos por Natureza
"Natural Born Killers", Oliver Stone - 1994
Amor à Queima Roupa
"True Romance", Tony Scott - 1993
E Sua Mãe Também
"Y Tu Mamá También", Alfonso Cuarón - 2001
Priscilla, a Rainha do Deserto
"The Adventures of Priscilla, Queen of Desert", Stephan Elliot - 1994
O Mágico de Oz
"The Wizard of Oz", Victor Fleming, George Cukor, Mervyn Leroy, Norman Taurog & King Vidor - 1939
Thelma e Louise
"Thelma & Louise", Ridley Scott - 1991
Paris, Texas
"Paris, Texas", Wim Wenders - 1984
sexta-feira, 24 de outubro de 2014
Sobre os meus fones de ouvido
O que é uma viagem senão sua trilha sonora? Essa pequena sessão de músicas resume o que mais me encanta ouvir enquanto rodo as estradas ou os ares desse planeta que tanto amo - sim, é o único que tenho e por isso, preciso explorar. Não é que eu não aprecio meu lar, afinal todos temos um pouco de alquimista, todos sabemos que a verdadeira felicidade está onde estão nossas raízes. Mas, a vida é muito curta pra ficar parado. Um conselho: saia do seu lugar de origem. Vá aonde ninguém te conhece, porque é só assim que você se encontra. Trabalhe pra ser livre. Dinheiro no colchão mofa. Tente fazer tudo isso sozinho, mas caso queira ir com alguém, que seja uma pessoa que respeite o seu silêncio e seus fones de ouvido.
- 340 - Fairy Tales
- Isobel Campbell & Mark Lanegan - Time of the Season
- Red Hot Chili Peppers - Road Trippin'
- Club des Belugas - The road is lonesome
- Lady Gaga - You and I
- David Ford - Song for the road
- Marisa Monte - Mais uma vez
- America - A horse with no name
- Dave Matthews Band - Ants Marching
- Bjork - Violently Happy
- Madonna - Sky fits heaven
- Moloko - Fun for me
Marcadores:
bagagem,
estrada,
felicidade,
gratidão,
individual traveller,
mochileiros,
paz,
road trip setlist,
silencio,
trilha,
trilha sonora pra viagem,
viajante individual
sexta-feira, 17 de outubro de 2014
Contos da Estrada: Sobre o Menino
Clique aqui: Trilha sonora pra esse conto
Ao final do terceiro dia o sangramento havia parado, a canja do boiadeiro animado fizera efeito e a necessidade de sair daquele lugar aumentava. Estava encantada com a praticidade e a sabedoria interiorana, onde senhoras semianalfabetas preparavam seus próprios remédios e soluções ‘Pra tudo, fia, menos pra morte’. Seu amigo boiadeiro a levou até a autoestrada e aguardou gentilmente até um carro parar e oferecer carona pra ela. ‘Até um dia, moça, Deus há de lhe perdoar. ’ ‘Amém, Seu Zé. ’
A confissão durou 57 km. Ele, em silêncio, ouviu tudo que ela tinha pra dizer. Não sabia o que dizer diante de sua narrativa. Não sabia até onde tudo aquilo era verdade. Mas sentia que precisava ouvir tudo em silêncio, e qualquer interrupção quebraria talvez, o único momento de alívio daquela criatura a quem ele dispusera o seu dia.
A confissão terminou em cima de uma ponte. Ela pediu que ele parasse pra que pudesse fotografar o pôr-do-sol. Respirou fundo, ajoelhou-se, pediu perdão e agradeceu.
A caminhonete seguiu caminho. Ele fez o que ela pediu ao final do quinquagésimo sétimo quilômetro. 'Deixe-me aqui e não olhe pra trás.'
Naquela ponte ficou uma mochila, uma máquina fotográfica e um par de chinelos.
Nenhum dos dois nunca mais foram vistos.
Seu Zé sabe, mas não conta.
Sentou-se no banco daquela
igreja, mas não teve coragem de se ajoelhar. Era sempre assim. Ajoelhar-se era
um tormento psicológico. Não conseguia e ponto. Um gato dormia logo ali no
banco da frente. Curvou-se, pegou aquela bola de pelos e acariciou por um longo
tempo. Sentiu os músculos, a respiração e assistiu-o lamber-se inteiro quando
se cansou dos carinhos daquelas mãos desconhecidas. Ambos se levantaram daquele banco e saíram
cada um pro seu lado. Nenhum dos dois havia rezado.
Ela ainda sentia uma leve dor que
vinha da cintura e ia até metade de suas coxas. Intensificava quando tentava se
agachar. Pensou que sairia ilesa daquela falsa santa casa, sem resquício nenhum
do que havia feito. Mas crime nenhum é perfeito. A dor era tamanha nos
primeiros dias que precisou pedir abrigo naquela comunidade antes de seguir a
estrada rumo ao nada. Um animado boiadeiro levava frutas, canja, pão e água
fresca até o seu quarto, instalado dentro da casa do patriarca da vila. A
senhora que a havia ajudado desde o minuto em que chegara naquele lugar passava
de hora em hora pela sua janela, perguntava: ‘tudo bem fia?’ e sumia. Ela
afirmava com a cabeça e voltava seus olhos àquela pequena TV no canto do
dormitório. 'Em quarenta dias tudo volta ao normal.' E era assim que conseguia
alívio para os seus pensamentos antes de adormecer. Ao final do terceiro dia o sangramento havia parado, a canja do boiadeiro animado fizera efeito e a necessidade de sair daquele lugar aumentava. Estava encantada com a praticidade e a sabedoria interiorana, onde senhoras semianalfabetas preparavam seus próprios remédios e soluções ‘Pra tudo, fia, menos pra morte’. Seu amigo boiadeiro a levou até a autoestrada e aguardou gentilmente até um carro parar e oferecer carona pra ela. ‘Até um dia, moça, Deus há de lhe perdoar. ’ ‘Amém, Seu Zé. ’
***
O riacho era raso, o que tornou o
banho ainda mais convidativo. O jovem seminarista que cedera um espaço na sua
velha caminhonete preferira ficar sentado embaixo de uma árvore enquanto ela se
refrescava um pouco. Ele descascava uma laranja e tentava não olhar pra aquela
forasteira, que a pele era tão branca que refletia como um diamante rosado em
meio aquelas pedras escuras. Ela percebia seu olhar, porém diante de tamanha
fragilidade do momento, preferira ignorar qualquer instante que remetesse a
carne. A voz daquela senhora dizendo ‘espera quarenta dias, fia’ não saía de
sua cabeça. A única coisa que sua mente enfraquecida guardara daquele momento
tão único.
Já no carro, a estrada continuava
deserta e os olhares daqueles dois seres se cruzavam nas poucas vezes que algum
caronista surgia em meio aquela imensidão. Ele não parou pra mais ninguém. Ele
queria apenas ela ali do lado dele, silenciosa e lacrimejante. ‘Você já ouviu
alguma confissão?’ ‘Não, nem posso ainda. ’ ‘Não importa, preciso me confessar.
’ A confissão durou 57 km. Ele, em silêncio, ouviu tudo que ela tinha pra dizer. Não sabia o que dizer diante de sua narrativa. Não sabia até onde tudo aquilo era verdade. Mas sentia que precisava ouvir tudo em silêncio, e qualquer interrupção quebraria talvez, o único momento de alívio daquela criatura a quem ele dispusera o seu dia.
A confissão terminou em cima de uma ponte. Ela pediu que ele parasse pra que pudesse fotografar o pôr-do-sol. Respirou fundo, ajoelhou-se, pediu perdão e agradeceu.
A caminhonete seguiu caminho. Ele fez o que ela pediu ao final do quinquagésimo sétimo quilômetro. 'Deixe-me aqui e não olhe pra trás.'
Naquela ponte ficou uma mochila, uma máquina fotográfica e um par de chinelos.
Nenhum dos dois nunca mais foram vistos.
Seu Zé sabe, mas não conta.
quarta-feira, 15 de outubro de 2014
Sobre o individual
Perguntada sobre o nome do meu
novo blog, hesitei mais do que gostaria pra responder. Só consegui dizer que o
armário ficara apertado e sufocante demais pra alguém que almeja conquistar o
mundo. Risinhos irônicos de minha parte e um olhar de descrença do outro, uma
vez que o título “Viajante Individual” tem como primeira (e talvez única)
definição: alguém que viaja sozinho.
Como assim conquistar o mundo? Sim, eu tenho o direito de conquistar o meu mundo. O mundo que eu tenho e que eu criei pra mim. Com os habitantes que eu quero que vivam nele. Com os valores que eu acho que prevalecerão. Priorizando o que o indivíduo é, não o que esse indivíduo tem ou o que ele pode oferecer pra mim. Esse mundo é lindo e é só meu. – Como diz alguém muito querido: “um mundo de seres e não de teres”.
Viajar individualmente, pra mim, não é viajar apenas sozinha. Sim, estar sozinha é parte de uma busca de mim mesma, e estar comigo mesma durante alguns dias é extremamente saudável dentro das minhas fraquezas e necessidades de melhoria. É saudável pra mim e pra quem me rodeia. Mas, por que as pessoas viajam? Eu viajo pelo indivíduo. Eu e o próximo. O anônimo, aquele que nunca mais reencontrarei. Mas sei que existe. E aprendi alguma coisa com ele. Algo que com certeza me fez um indivíduo melhor.
Honrar territorialmente esse lugar onde mereci nascer. Pisar em solos diversos, respirar o ar que é sempre distinto, sentir as temperaturas oscilantes das brisas em meu rosto, ver o Sol se pondo em diferentes cantos, comer o fruto de cada terra, me deitar em diversas camas e me aconchegar em diversos braços e abraços. Ser um indivíduo que viajou e conheceu o mundo.
Como assim conquistar o mundo? Sim, eu tenho o direito de conquistar o meu mundo. O mundo que eu tenho e que eu criei pra mim. Com os habitantes que eu quero que vivam nele. Com os valores que eu acho que prevalecerão. Priorizando o que o indivíduo é, não o que esse indivíduo tem ou o que ele pode oferecer pra mim. Esse mundo é lindo e é só meu. – Como diz alguém muito querido: “um mundo de seres e não de teres”.
Viajar individualmente, pra mim, não é viajar apenas sozinha. Sim, estar sozinha é parte de uma busca de mim mesma, e estar comigo mesma durante alguns dias é extremamente saudável dentro das minhas fraquezas e necessidades de melhoria. É saudável pra mim e pra quem me rodeia. Mas, por que as pessoas viajam? Eu viajo pelo indivíduo. Eu e o próximo. O anônimo, aquele que nunca mais reencontrarei. Mas sei que existe. E aprendi alguma coisa com ele. Algo que com certeza me fez um indivíduo melhor.
Honrar territorialmente esse lugar onde mereci nascer. Pisar em solos diversos, respirar o ar que é sempre distinto, sentir as temperaturas oscilantes das brisas em meu rosto, ver o Sol se pondo em diferentes cantos, comer o fruto de cada terra, me deitar em diversas camas e me aconchegar em diversos braços e abraços. Ser um indivíduo que viajou e conheceu o mundo.
Seguirei minha estrada agora,
individualmente. Eternamente grata a todos que passaram por mim e dividiram um
pouco de si.
Quanto ao armário, ele ainda está
lá. Voltarei pra dentro dele sempre que achar necessário. terça-feira, 14 de outubro de 2014
Notas da Estrada III - Sobre diálogos e insônias
-Quero.
-Não posso.
-Por quê?
-Não tem.
-Cadê?
-Sumiu.
-Por quê?
-Egoísmo.
-Seu?
-Meu? Não. Seu.
-Não sou.
-Sim, você é.
-Vou dormir.
-Boa noite.
-Apague a luz.
-Não posso.
-Por quê?
-Não tem.
-Cadê?
-Sumiu.
-Por quê?
-Egoísmo.
-Seu?
-Meu? Não. Seu.
-Não sou.
-Sim, você é.
-Vou dormir.
-Boa noite.
-Apague a luz.
-Estou lendo.
-Não consigo dormir.
-Leia.
-Quero de novo.
-Não posso.
-Por quê?
-Não consigo dormir.
-Leia.
-Quero de novo.
-Não posso.
-Por quê?
segunda-feira, 13 de outubro de 2014
Sobre o Paraíso
Dizem que se você for uma boa pessoa, não fizer mal a
ninguém, trabalhar honestamente e amar o próximo como se não houvesse amanhã,
você vai para o céu. Aquele mesmo céu que a gente aprendeu nas aulas de
catequese, aquele onde a água é cristalina, os campos são verdes, as pessoas
são boas e os bichinhos vivem tranquilamente. É verdade. Eu não sou nem de longe uma pessoa tão boazinha assim. Mas de
alguma forma o universo me recompensou com uma passadinha no paraíso, só pra me
lembrar do quanto ainda vale a pena continuar nesse planeta (lindo).
Enfim. Quer conhecer o Paraíso? Vá até o Distrito Federal.
Em Brasília, saindo do aeroporto vá até a rodoviária, se for de táxi, dá no máximo R$ 30,00, mas também há a
opção de ônibus executivos e comuns. A distância é curta, o trajeto leva uns 20
minutos. A viação Real Expresso faz 2 viagens por dia para Alto Paraíso, a estrada é linda e em menos de 4
horas você chega aqui, no melhor cantinho do mundo.
A cidade é pequena, tem todas as características interioranas,
num misto de sertanejo e comunidade hippie. Tem estrutura pra turismo, as
pessoas são gentis e o ar é puro. Existem pousadas, hotéis, hostels, campings e
calçadas pra repousar. A pracinha é charmosa, onde se come a melhor tapioca
(pelo menos em minha opinião) e conversa-se em inglês como se estivesse nos EUA.
O número de estrangeiros que abandonaram tudo e compraram propriedades é
imenso. Diziam que se o mundo acabasse a Chapada dos Veadeiros seria a melhor
chance de sobrevivência. Alguns a chamam de “berço do recomeço”. Ironicamente,
fiquei sabendo disso dias antes de embarcar nessa aventura, num momento em que
tudo que preciso é recomeçar. Novamente, obrigada universo.
Os passeios são infinitos. As trilhas perigosas, as
cachoeiras iluminadas e a água abundante, cristalina e gelada. A paz prevalece.
Alugue uma bicicleta e vá até Loquinhas. Contrate um guia local e vá até
Cristais, Almécegas, Santa Bárbara, Macaquinhos, Vale da Lua, Vila de São
Jorge, Quilombo Kalunga. Coma pizza. Ah, a pizza. Tome suco de frutos do
cerrado. Beba água da cachoeira. Assista o pôr-do-sol. O nascer do sol. Perca
peso e faça suas celulites sumirem nas subidas e descidas, nas grandes montanhas
e nos campos vastos. Não beba álcool. Silencie-se
e, acredite, dá pra meditar 24 horas por dia. Saúde o Espírito que vive dentro
de você.
Alto Paraíso é assim.
Um lugar para renascer.
Marcadores:
alto paraíso,
bagagem,
brasil,
brazil,
chapada dos veadeiros,
como chegar em alto paraíso,
felicidade,
goiás,
individual traveller,
mochileiros,
silencio,
sunset Hunter,
trilha,
viajante individual
Sobre a Ilha
Eu andei alguns bons metros pra chegar até lá. Em todas as
buscas que havia feito, a gruta era uma das principais atrações. Sabia que
precisava conhecê-la, que a trilha pra se chegar até lá era linda e fácil, que
a praia que eu encontraria seria deserta. Eu sabia de tudo
isso. O que não imaginava, seria a sensação de estar lá dentro.
A gruta é pequena por dentro. Gigantesca por fora. Quando a
maré está alta, não se entra. A praia estava deserta, assim como a maior parte
da ilha. Decidi viajar no inverno, pois sei que o inverno numa ilha tem o vazio
que eu procuro nas minhas trilhas.Estendi uma canga, sentei em posição de lótus e durante um longo período, ouvi duas goteiras apressadas, sincronizadas e incessantes, o barulho das ondas do mar ali do lado e o silêncio milenar daquelas rochas que me abrigavam. Ouvir o silêncio de uma gruta é uma das coisas mais purificantes que já experimentei. Feita meditação, preenchida pela paz e grata pelo momento, me levantei para o alongamento e, até aquele momento não havia feito isso, olhei para um canto da gruta. E eu a vi. Uma minúscula imagem de Nossa Senhora Aparecida, escondidinha no meio de pedras há muito tempo. De alguma forma, parecia que estava esperando por mim.
Pela minha base católica, rezei Ave Maria. Pela minha alma milenar, pedi. Por tudo que estava sentindo naquele momento, agradeci. Retirei-me da gruta, me despi e deitei naquela areia quente.
Desse momento, sobrou-me um texto nunca publicado. Desse instante, restou-me a busca por uma nova essência. Desse dia, a ideia de que tudo estava certo. Desse período, o aprendizado.
Ontem foi dia de Nossa Senhora. Lembrei-me dela, dessa viagem e de mim. É certo que minhas preces foram ouvidas. Pedi a ela que tirasse todo o mal de perto de mim. Pedi a ela que me mostrasse os caminhos e mantivesse apenas o que fosse verdadeiro. E foi assim que eu acordei hoje. Sabendo que apenas o verdadeiro importa. Feliz e grata por ter fé.
Marcadores:
gruta das encantadas,
ilha do mel,
individual traveller,
inverno,
mochileiros,
Paraná,
Paranaguá,
paz,
praia das encantadas,
silencio,
sunset Hunter,
trilha,
viajante individual,
winter
sexta-feira, 10 de outubro de 2014
Sobre Tito
Sentiu um cheiro forte de café antes de abrir os olhos. Uma luz fraca entrava pela janela, e a primeira coisa que viu ao despertar foi um cãozinho tentando puxar seu osso que nesse momento estava debaixo dela. Levantou um pouco as costas, o suficiente para ajudar Tito, o cãozinho, a retirar o seu brinquedo. A porta do quarto se abriu e ele entrou, carregando uma xícara de café com leite. “Café fervendo, leite frio e 9 gotas de adoçante. É assim, não é?”, perguntou sorridente. Ela concordou com a cabeça, sorriu honestamente e bebeu dois longos goles de seu desjejum preferido. Leram alguns textos, tentaram escrever alguns poemas. Falaram pouco.
O dia de ir embora estava próximo e ela precisava sair dali. Uma força parecia a segurar naquele lugar. Passava os dias com o cãozinho, não se alimentava até que ele voltasse do trabalho e cozinhasse algo pra ela. Aquilo não o incomodava. Ele sabia que precisava voltar pra casa e alimentar aqueles dois seres que o aguardavam com tanto carinho. Eles conversavam sobre o dia dele. E ela lia pra ele os melhores textos que havia lido no dia dela. Comentavam o telejornal, se alimentavam, adormeciam juntos e muito cansados.
Até que um dia ele voltou do seu trabalho e ela não estava mais lá. Nenhuma carta, nenhuma mensagem. Tito olhava pra ele, como que dizendo “é, meu amigo... ela se foi”. Ele sentou-se na cama, sentiu o cheiro dela no seu travesseiro e adormeceu. Por dois dias seguidos. Ele sabia que ela estava feliz. E isso bastava.
Acordou, tomou um gole de
conhaque e saiu pra trabalhar.
quarta-feira, 8 de outubro de 2014
Notas da Estrada II - Sobre a Piedade
Almecegas, Alto Paraíso-Goiás |
Ninguém perde por rezar
Mesmo que por um ser que não existe.
Ninguém se perde por tentar amar uma criança.
Mesmo que esse ser não exista.
Tende piedade.
Se te engana é porque tem medo.
Se te machuca é porque é covarde.
Se mente é porque ainda não encontrou a sua própria verdade, a sua idade, a sua escolaridade, a sua paternidade.
Se te fez gastar o pouco de dinheiro que tinha, é porque a avareza lhe tomou a alma.
Se espalha a tristeza por onde passa,
Se enche o próximo de uma falsa esperança,
É porque o vazio prevalece em seu coração.
Se te humilha é porque está cego pela ambição.
Se apareceu na tua vida é pra você entender a sua grandeza. Se veio, foi pra mostrar a pequenez do ser humano. Aceite.
Tende piedade.
Liberta-te
Refaça-te
Tende piedade.
Ama-te.
Perdoa-te.
Assinar:
Postagens (Atom)