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É como se estivesse tentando prender o ar dentro de um pote
de vidro. É a sensação que eu tenho quando me vejo presa geograficamente por um
longo período. É a mais pura verdade: sem viajar eu não consigo nem escrever.
Me viro como posso, presa nessa cidade que me sufoca. Abraço
árvores em pracinhas da esquina, de vez em nunca vagueio pela cidade à noite,
sozinha, em lugares relativamente seguros, só pra poder respirar a cidade,
ouvir um pouco do silêncio da noite, e me sentir um pouco livre. O excesso de
pessoas, carros, barulho faz mal pra mim. Elevadores, espelhos, escadas
rolantes, celulares com pessoas gritando com você por motivos que você não
entende. Protestos, vigilância, opressão. Tudo isso me mata aos poucos. Não,
não são os meus vícios que me matarão. É a tristeza de ver um mundo com pessoas
tão alienadas com tanta razão e tão dispostas a te julgar e te sentenciar. Só
porque você escolheu ser assim.
Ser livre pra mim é estar na estrada. É conversar com
anônimos que não esperam nada de você, a não ser uma boa história, ou uma piada
inusitada. É poder falar apenas com quem eu quiser. De preferência só com as
pessoas a quem eu pagarei pelas minhas refeições e acomodação. É poder meditar
ao som do mar sem ser interrompida pelo martelo do pobre vizinho que só tem os
fins de semana para construir seu barraco humilde na rua de cima da minha casa.
Sinto falta de andar numa trilha, de ver cachoeira, de
contar estrelas, de acender fogueira para assar marshmallows e salsichas, de
tomar chimarrão, de passar o dia dentro da água. Fotografar tudo, fotografar a
vida, fotografar os milagres de Deus. De abraçar árvore sem ninguém te olhando
como se você fosse a louca do sobrado. De ficar descalça com o pé imundo e só
calçar algo se forem meus trekking boots.
Trabalho para ter isso de volta. Cedo ou tarde estarei
explorando mais uma cidade histórica, subindo mais uma montanha, armando mais
um acampamento, carregando 28 quilos de mochila nas costas. Pelo menos por alguns dias. Sozinha ou
acompanhada não importa. Quero apenas me sentir livre e parte da natureza de
novo. Sem muros, sem concreto, sem conexão. Que minha única “rede” seja aquela
que eu vou me esticar no final da tarde depois de um dia de aventuras.
Porque eu preciso voltar a ser quem eu sou de verdade.
Uma
viajante.